21.10.07

As coisas que deixam de existir

Em um domingo de ressaca me esforço para acordar e almoçar com a minha família. Após comer, uma preguiça gigante toma conta de mim e deito confortavelmente no sofá. Pego o controle da televisão e vou a busca de algo para me entreter.
Na frenética troca de canais encontro uma atração que provoca em mim um sorriso pueril. Começava naquele momento um episódio saudoso de Friends, para o meu delírio. Eu era viciada no seriado durante o tempo de colégio. Assisti feliz aquela meia hora nostálgica. Desejei que Friends não tivesse acabado.
Fico triste quando lembro de algo que gostava muito e que por algum motivo entra em extinção. Os seis amigos de Nova York são apenas um singelo exemplo. No entanto, posso citar outros memoráveis: Kit Kat (recordo da propaganda que tinha uma vaca e dava ênfase no barulhinho maravilhoso do chocolate), Fofys (os biscoitos de ursinhos mais perfeitos que já existiram) e uns chiclets compridos e fininhos que vinham em uma embalagem de latinha que não sei o nome.
Não entendo o motivo pelo qual coisas tão boas saem de mercado. No ramo das guloseimas o que me consola ainda é o chocolatinho Refeição, que inclusive mantém sua embalagem original. Se ele também não fosse mais encontrado não sei o que faria para saciar meus doces desejos.
Na televisão, episódios inéditos de Sex and the City ainda fazem muita falta. As quatro amigas me divertiram durante seis temporadas. Sendo assim, conto o tempo para o lançamento do filme em março de 2008 nos cinemas. Será um breve retorno, acredito que apenas um encerramento da trajetória de Carry, Samantha, Miranda e Charlotte, porém isso vai matar um pouco da saudade da série.
Com certeza cada um que ler esse texto vai lembrar de uma centena de coisas a mais que deixaram de existir, mas não saíram da nossa memória. Se for assim com tudo, expresso imediatamente meu sentimento de lamentação por esse sistema que tira pequenos prazeres da humanidade. Sei que era um ato de canibalismo devorar aqueles amados ursinhos Fofys de chocolate. Todavia, dava a ponta do meu mindinho pela sensação de retornar a infância com um daqueles pacotes vermelhos na mão. Quanta saudade.

14.10.07

Entre velas, imagens e clichês

A entrada é silenciosa. Piso levemente, desejaria flutuar para não ser notada. São 9 horas no horário novo, 8 então na verdade. A igreja encontrava-se cheia e ninguém percebe minha singela presença. Estava 30 minutos atrasada.
Devia fazer mais de um ano que eu não pisava em um templo religioso. No entanto, o sacrifício de levantar tão cedo em pleno domingo era por um amigo, sendo assim, uma missão muito importante.
Parei ao fundo e logo o vi. Ele se destacava naquele ambiente tão casto. Fui em sua direção e sentei no mesmo banco em que estava. Antes que me visse, peguei a sua mão. Seus olhos brilharam quando encontraram os meus. Foi a primeira vontade de chorar.
Nos abraçamos forte. Eu não falei que sentia muito, porém eu realmente sentia demais. Fugi do chavão, mas não consegui evitar as lágrimas quando levantamos para rezar o Pai Nosso.
Meu amigo havia perdido o pai há uma semana. Não conseguia pensar em tamanha dor, impossível dizer “Eu posso imaginar o que estás sentindo”. Seria uma idiota se falasse tais palavras, afinal, enquanto ele chorava a morte daquele que o criou eu sabia que o meu protetor estava em casa e dormia tranqüilamente.
Além de ser uma missa de sétimo dia de falecimento, na ocasião seria realizado o batizado de uma dezena de crianças. Pensei na minha tia e no meu afilhado que deve nascer nos próximos dias. Logo estaria de volta naquela igreja, todavia em outra posição, a de madrinha.
Quanta ironia celebrar a vida e a morte no mesmo dia, na mesma hora. Todavia, é assim independente de religião e da nossa vontade. Depois de refletir olhei novamente para ele. Tinha a cabeça baixa e movia as mãos sob as pernas. Muitas palavras surgiam na minha mente, no entanto deixei o silêncio falar por mim.
O ritual acabou e nos levantamos. Na saída, queria me despedir dizendo algo significativo. Sorri com sinceridade e pela última vez o tive em meus braços. Parecia que aquele homem enorme ia despencar em meu corpo. Senti sua carência e fragilidade naquele momento. Afastei-me e disse “A gente se vê”. Ridícula. Não consegui segurar nem sequer por meia hora um clichê.

7.10.07

Ainda somos os mesmos

Elis que tinha razão. Como ela afirmava: “Ainda somos os mesmo e vivemos como os nossos pais”. Comprovei tal tese na noite de ontem, sou um projeto da minha mãe. Detalhe: isso era tudo que eu temia por toda a adolescência.
Na fase mais rebelde da vida eu odiava o modo com que a minha genitora agia, principalmente em relação aos meus interesses. Considerava-a uma intolerante, ditadora do lar dos Etges. Após as nossas brigas, sempre declarava baixinho choramingando no quarto para mim mesma: “Eu não vou ser assim”.
No entanto, a história mudou um pouquinho. Agora creio que sou levemente mais madura e percebo certas situações de outra forma. Posso assegurar que ando contida, há algum tempo estou mais calma e paciente. Já fui a líder brigona da turma do colégio. Era a primeira a reclamar de algo que não concordava. Hoje, deixo algumas coisas passarem, talvez por preguiça ou comodismo, mas isso não vem ao caso no momento.
Meu pai sempre foi agitado e a mãe mais na dela. Envergonhada, foge até de fotografias. Não sou tão tímida, mas a brabeza característica da taurina aqui de casa é a mesma. Digamos que sou facilmente irritável. Se digo isso com base na análise do meu período atual, imaginem como já fui.
Enfim, as conclusões e pensamentos acima se tornaram possíveis recentemente. Ontem agi exatamente como minha mãe, até fiquei com medo. Os braços cruzados e o biquinho na cara me denunciaram. Não consigo acreditar que vou ser má como ela. Porém, hoje acordei pensando que talvez eu possa entendê-la em algumas situações que antes me pareciam absurdas.
Quando meus pais brigavam e no fim de tudo a via acalmar a situação e procurar um equilíbrio achava estranho. E o orgulho? Não concordava. Agora compreendo que essa palavra não deveria existir ao se abordar relações humanas. Aprendi a relevar tanta coisa, arte que com certeza minha mãe já dominava há tempos.
Hoje me vejo como mediadora também. Conviver com pessoas mais velhas me deu uma certa serenidade para agir e pensar. Isso não significa que não me descontrolo momentaneamente. Tento me conter, troco de ambiente e choro sozinha. Respiro e bebo um pouco de água. Depois de retocar a maquiagem, visto a roupa da namorada compreensível e volto para a sala. Nada como aprender a ser adulta. Preciso praticar mais vezes.